Friday, April 04, 2008

Saudades de um Eu

Estou com saudades de mim. Do meu verdadeiro eu. Já não há a execução em pleno de uma realidade, nenhuma. Há o alheamento desta, filtrada na exuberância de um sentimento imprevisível e louco. Nos poros do filtro ficam as tuas imagens, evocações etéreas de um sonho burilado ao pormenor, cinzelado num coração desfeito; o resto da realidade flui perpetuamente, na sua linearidade intransigente, avessa à circularidade que exige a lógica do amor. Este nosso desencontro provou a irredutibilidade dos factos, a inverosimilhança da realidade como o fio da narrativa ideal que construí em teu redor - e tu, como um redemoinho ávido, sugaste o fio por inteiro. A precisão de corte do amor por ti foi a de um bisturi, exacto e glacial, pois aquele nasceu da pura simpatia, pelo que não deixará feridas de uma lâmina romba, apenas a marca perene e sublime, até sensual, de uma tatuagem. A circularidade momentânea do amor está a desaparecer, a vulnerabilidade dos sentidos está a ceder à linearidade intensa do quotidiano. Espremidos pelo acaso, os meus dias vão agora suceder-se em direcção ao finito da existência, de forma fútil, esfiapados pela sede de infinito amor que os precedeu. Estou de volta. A mim mesmo.





Espiral de Fraser: A ilusão das cordas que parecem entrelaçar-se mas que nunca se cruzam - será esta a ilusão de um amante?