Sunday, February 15, 2009

Luar


Adoro o luar. É uma luz que nos inunda, mais do que nos ilumina. Banha-nos a existência, num bálsamo não constrangido. É uma luz que escorre, metal líquido de visões fantásticas, luz de falsidade. Falsa, porque tenta mostrar tudo, numa definição fluida, e apenas consegue dar um contorno nítido às sombras, uma precisão ao desconhecido. Mesmo nas tépidas noites de Verão, é uma luz glacial, que dá enfâse às incoerências das cores soturnas, e alumia de forma fria todos os devaneios que flutuam, intrincados, como líquidos na noite escura. É uma luz desequilibrada que nos toca (com os seus dedos serenos), solidifica os nossos sonhos: surgem à nossa frente, inertes, inamovíveis e perenes nesse clarão de prata, nesse fulgor frio e doce. Será que sonhamos acordados sob o luar? Ou estamos acordados num sonho de milagre? Miraculoso, porque estou rodeado de algodão, um algodão prateado, que me afaga o corpo, num mistério adensado pelo ardor dos meus olhos. Enquanto enxaguo o meu corpo com a luz da lua, que flui indefinidamente com uma viscosidade quase nula, forma-se uma poça no chão - a minha sombra, atrás de mim, mais escura do que a noite que me envolve-, uma poça de lágrimas de sonhos sonhados, e, por isso, possíveis. As noites são dias. Mas não são dias dourados pelo sol. São dias argênteos. Mas não são dias esbatidos. São dias de luz esbatida, sonhados numa luz dourada de prata, ou numa luz prateada de ouro, não importa. O que importa é o alento dessa luz, produzida nos filamentos das estrelas e da lua. Há um fervilhar de vida no meu peito e um deslumbramento até à superfície das coisas. Há uma vida inteira dentro de mim, diz-me, de forma poética, o luar.